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domingo, 13 de fevereiro de 2011

Hidrelétrica de Belo Monte: desenvolvimento, sim, de qualquer jeito, não!


Por Marcelo Salazar (*)
As manifestações contrárias à construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, que ocorreram essa semana por todo o País, suscitaram reações por parte do governo federal, que apressou-se em defender o processo de licenciamento e a viabilidade da obra.

Algumas questões, entretanto, permanecem sem resposta. Os processos de consulta aos povos indígenas não ocorreram de acordo com o previsto no artigo 231 da Constituição e na Convenção 169 da OIT. Se, de fato, as consultas tivessem acontecido do modo devido, indígenas e população local conheceriam o projeto e seus impactos. Não é possível considerar como consulta, eventos em que não houve informação prévia, no qual as pessoas não sabiam sobre o que estavam sendo consultadas, e nos quais suas ponderações, quando permitidas, não eram levadas em consideração ou respondidas. Basta uma visita à cidade de Altamira ou a qualquer aldeia indígena da região para constatar que ninguém sabe o que é o projeto de Belo Monte e suas consequências para a população local.

A declaração feita pelo presidente da Empresa de Planejamento Energético, Maurício Tolmasquim, publicada pelo jornal Extra de 31 de janeiro último, de que somente 4 300 famílias serão realocadas, não consta de nenhum documento público sobre a obra. As pessoas na região não sabem quem será realocado, o que demonstra outra falha no processo de consulta que o governo afirma ter feito.

A afirmação de representantes do governo de que não haverá Terras Indígenas impactadas diretamente também contradiz o que está explícito tanto nos estudos (EIA/Rima) como nas próprias licenças concedidas pelo Ibama, com anuência da Funai, que reconhecem a necessidade de monitoramento dos impactos que serão causados pela redução da vazão do Rio Xingu na região onde encontram-se as Terras Indígenas Paquiçamba e Arara da Volta Grande.

É comum ouvir das autoridades que apenas as populações que vivem em áreas a serem alagadas serão impactadas pelas barragens, sem levar em conta que a redução da quantidade e da qualidade da água disponível para uma população também é um impacto significativo, que não pode ser desconsiderado pelo governo e pelos empreendedores. Do mesmo modo, a previsão de chegada de milhares de pessoas na região (calcula-se quase 100 mil pessoas que se somarão aos 78 mil que habitam hoje Altamira) por conta do empreendimento acarretará impactos sociais diretos como inchaço das cidades, sobrecarga de hospitais e escolas, falta de saneamento básico entre tantos outros que envolvem até insegurança alimentar.

Se o governo e os empreendedores querem construir Belo Monte, deveriam dimensionar corretamente os custos socioambientais da obra; preparar a região para receber e se beneficiar de um empreendimento dessa monta; atender as 66 condicionantes da licença prévia e informar de modo claro e honesto a população local sobre as mudanças que a obra acarretará em seu modo de vida.

(*) Coordenador adjunto do Programa XIngu do ISA

Fonte: http://g1.globo.com/platb/natureza-isa/2011/02/11/hidreletrica-de-belo-monte-desenvolvimento-sim-de-qualquer-jeito-nao/

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